quinta-feira, julho 19, 2012

Crônicas Normais │ Parte 02

Foi totalmente desinteressante caminhar pela casa a caminho da porta para a rua. Sentia-se ávido pela vida, mas não conseguia se regozijar por ela, com ela...

Tão novo e já morava só. Seus pais o sustentavam na cidade, para que ele pudesse estudar e se formar em quatro anos, e ele já nem se lembrava em que mais.

Ao cruzar o corredor que dava para a sala, passou pela entrada da cozinha e acabou pegando algo pra mordiscar na geladeira, afinal, seu estômago o estava castigando com uma dor pungente e interminável.

Passou pela porta... sua vontade de viver estava fervilhando, a forte e recém lembrança da vizinhança vista pela janela o estava impulsionando para querer viver pra fora, esquecendo de tudo o que atormentava.. Mas... É, sempre tem o porém.

E, foi passar pela porta e cruzar o quintal, receber os primeiros acenos, cumprimentos e acenos, que tudo se tornara cinza novamente. Nem chegou a morder o que havia separado para comer, simplesmente largou na primeira lixeira e caminhou. Caminhou pelo cinza dos seus olhos, ignorou as pessoas, mal viu as crianças, e as cores das roupas nos varais... Dessas ele nem mais se lembrava.

Ele fazia força pra se lembrar do motivo de tanta dor, de tantas dúvidas. Seus passos se multiplicavam e as perguntas que antes tinham respostas agora se tornavam motivo de novos questionamentos, sobre velhas coisas.

"Porque dói tanto, do que tanto duvido, porque a vida não parece mais ter graça? Porque..."

Andou por minutos a fio e a esmo, sem ao menos saber se ainda estava numa vizinhança conhecida. O Sol estava forte, mas ele, estava de casaco. Um moletom velho e surrado de algum personagem de desenho japonês que nem ele era mais capaz de reconhecer. E o calor, por mais que o incomodasse, parecia ser mais um motivo para andar com aquele moletom.

Parou.

Ele estava de frente a uma livraria, e ali estava um lugar que o fazia sentir bem. Ler era como se drogar pra ele. Era fugir da realidade sofrida e viver mil vidas em mil mundos. Era poder ser.

Quando se deu por conta já estava folheando um livro, que agora o tema ele já nem lembrava, pois foi naquele momento que algo mudou dentro do seu dia, da sua dor, do seu torpor...

Uma voz feminina, doce, fina e concentrada ecoava dentro dos seus pensamentos, enquanto ele viajava nas palavras do livro. Ela o sacudira pra ter atenção.

Não era bonita, talvez não nos padrões que se espera, era magra, rosto forte, olhos pretos penetrantes e vivos, cabelos também pretos, lábios brilhantes... E, novamente ele se perdera...

Seu coração bateu forte, as mãos suaram, chegou até a pensar em sexo.

Ela, só queria uma informação, e o confundira com um antigo funcionário. Decepção.

Saiu dali e parou na porta da livraria, olhava e observava o movimento da rua... Seu peito doía.

"Por que, por que, por que"

Era só o que lhe rondava a mente. Ele estava confuso. Ele estava... Já nem ele mesmo sabia.

Mas, ele decidiu que naquele dia, ele descobriria sua resposta. Decidiu que teria sua vida de volta. Decidiu que queria parar de sofrer sem nem mais se lembrar o por que.

Mesmo sem conseguir ver as cores da vida, mesmo com o pensamento nebuloso de tantas perguntas, mesmo com o corpo e a aparência em bagaços, ele tinha que ter as respostas.

Chegou até a pensar se as respostas seriam mesmo importantes... Talvez fosse melhor simplesmente arrumar  um motivo, como seria a moça da livraria... "Um amor para curar uma dor" - Talvez.

O certo, é que ele sabia dos seus limites, queria reagir mesmo sem saber como...

Então, leu:

"Uma vida não questionada, não merece ser vivida - Platão"

E tornou a caminhar.

Continua...


3 comentários:

  1. Olá Nelson..
    A história está ficando cada vez mais interessando. Estou acompanhando avidamente o desenrolar desse enredo. Lembra-me cenas de filmes europeus. Você escreve muito bem.

    Um grande abraço do seu fã do Nordeste.

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  2. Oi Nelson!
    Sempre venho aqui, leio e silencio... Acompanho sempre as atualizações da sua vida normal. Mas é assim, quando o texto é bom muitas vezes me deixa sem palavras, mas a sua reflexão continua ecoando em mim.

    Adorando a crônica!!!

    Bjusss da sua leitora não-ausente e um pouco silenciosa ultimamente!!!

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    1. Obrigado Zélia! =)

      Essa semana tenho tantas coisas pra falar....

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Obrigado por comentar.